domingo, 31 de janeiro de 2016

Desacelerando


Uma mulher se atira diante do metrô, cena não incomum da contemporaneidade, e que me parece carregada de significados. Um dia, ao invés de ingressar em um vagão lotado, da massacrante rotina de trabalho, e calor, poluição, e perda de sentido, que marca grande parte desta era industrial, altamente produtiva e pouco humana.

No filme clássico de 1993, “Um dia de fúria.” (Falling Dall), estrelado por  Michael Douglas, trata de um homem, que no meio de um engarrafamento, resolve abandonar tudo, em uma jornada  de “protestos” contra as grandes incoerências da vida em uma sociedade de consumo, em uma jornada que infalivelmente o levaria a morte. Deixando uma mensagem: morrer é melhor do que isto.


O ser humano foi capaz de constituir uma capacidade produtiva, tecnológica, de trabalho e produção de conhecimento, realmente titânica. Fomos capazes de produzir muito do que a ficção cientifica imaginou nas décadas em que a revolução tecno-cientifica se iniciou e as perspectivas futuras são a maioria das vezes assustadoras. 



Em tese, nada seria melhor, do que conquistarmos a capacidade de criar e produzir inovações que auxiliem o homem na sua jornada, na construção de um planeta melhor, em que, diferentemente dos nossos primeiros ancestrais, não sejamos massacrados pelas condições naturais adversas, como as secas, as doenças, terremotos, furacões, pestes, animais peçonhentos entre outros.  O que deu errado nesta história?

A partir da produção de roupas que nos protegiam do frio o homem pode explorar os terrenos mais austeros da terra, como os esquimós que se adaptaram a viver no pólo norte. Os calçados possibilitaram andar sem se machucar ou protegidos de cobras e outros animais. Inventamos modos de conservação de alimentos para que sobrevivêssemos a tempos de seca e frio extremo,  em que os alimentos se tornavam escassos. Encanamos a água, que chega no nosso lar, a tratamos evitando doenças  que matavam e causavam muita dor. Construímos casas confortáveis, cidades, cinemas, templos, foguetes..etc.

E os exemplos seriam inumeráveis, o homem é capaz de transformar o ambiente em seu favor, ele é capaz, por meio da inteligência e engenhosidade, de superar as condições adversas do ambiente natural e criar uma vida mais rica, onde pôde voltar sua força e capacidade para aspectos mais elevados da existência, como o refletir sobre sua própria condição no mundo, no universo, a filosofia, o lazer, o entretenimento.

Porém, algo deu errado, em algum momento esta capacidade alcançou um poder inimaginável, e um grande lapso se estende a até a atualidade, o homem dormiu e deixou a fogueira acesa . Aquilo que foi inicialmente o que havia alçado os homens em superioridade diante dos animais, quando chegou a se postular a idéia de que  “o ser humano é um ser racional”, se tornou a própria fonte de adversidade, morte e desconforto para o homem.

Em mais de dois séculos de revolução industrial o homem  não foi capaz de tornar-se sujeito de todo esse poder de criação, e as seqüelas deste atropelamento do modelo humano sobre o próprio homem não param de se acumular. O homem moderno, inserido no modelo econômico de alta produtividade não pôde parar. A vida nos engloba em um movimento que nos toma por completo, e estamos reféns de uma situação construída por nós mesmos.



Podemos amar a natureza e louvar os “tempos antigos” onde havia harmonia e equilíbrio. Apesar disso, um dia acordamos e temos  necessidades econômicas, precisamos comprar nossa casa, queremos visitar a praia, desfrutar do mundo ou simplesmente sobreviver. O acesso  a vida depende  de nos tornarmos produtivos, e ingressamos em um modelo econômico, que sobrevive da aceleração da economia.

Isso significa que, para gerarmos empregos, temos de produzir, mais e mais, sem parar, fazer mais carros, construir mais casas, aumentar constantemente o uso de usinas, barrar mais rios, criar mais lixo radioativo, indiferença em relação aos excluídos, mais doenças, mais hospitais, monoculturas repletas de agrotóxicos e transgênicos, criar mais o que se comprar. Trabalhamos arduamente para um mundo em constante piora, e é melhor não pararmos para pensar, uma vez que não existe saída.
Hoje no nosso país, assim como no mundo, tanto a política de esquerda quanto de direita tem como regra básica governamental, constituir políticas de aceleração da economia. Precisamos gerar empregos, criar renda, valorizar a moeda, para que as condições sociais não despenquem e um novo inferno social e estrutural, das crises econômicas, se estabeleça mais uma vez.

No Brasil sabemos bem, a crise que é causada pela diminuição da aceleração da economia começa, logo pessoas começam a ficar desempregadas, a violência volta a aumentar, a insatisfação vai se retro alimentando em cada uma das conseqüências, e não pretendo neste texto apontar as possíveis soluções para essa armadilha que se estabeleceu no modo de produção contemporânea,  antes descrever de forma mais clara que pude o paradoxo moderno em que nos aprisionamos, e sobre o qual devemos refletir.    



Ecologia, Economia, Responsabilidade universal

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